terça-feira, junho 30

Mar que serpenteia o Arpoardor
Banha-me,
Acalma-me a alma
Isso que me ladeia
Encanta-me com sua harpa
Mesmo este resto que ainda é dor
Rio meu, de margens tortas
Corredeiras
Feitas de pedras finas, lisas e faceiras
Perco-me em seus leitos
Peitos de meninas esculpidas em argila.
A benção de um Rio de Janeiro
São Sebastião.

sexta-feira, junho 12

já estava assim desde um tempo atrás.
agora resolvi olhar para ele.
estava cansado. e não sei pq.
sentia tudo pesado.
sem forças para seguir.
os sonhos estranhos pontuam a toada.
os cigarros trazem à noite escura
o branco de outras enluaradas.
o que não é bom. mas é o que alivia.

quarta-feira, junho 3

E o mundo ainda não aprendeu.

*"Dói internar um filho.

Às vezes não há outro jeito"


ontem, lendo uma reportagem de uma revista semanal que trazia entre outras fontes *Ferreira Gullar... me lembrei de Sorôco, do Guima. o tema da reportagem era como sempre o da moda: o sofrimento mental, que foi guindado às grandes rodas de discussões graças a um personagem da novela global. bem, como o tema veio à baila pouco nos interessa, afinal, a sociedade é movida por esses repentes midiáticos mesmo, mas o que nos toca aqui é olhar para a questão, e Ferreira o faz com a sensibilidade de quem sentiu o arfar da realidade dos sonhos sobre os ombros dos filhos.

ao meu ver o diálogo a respeito das questões psíquicas em nosso país ainda se arrastam, apesar de tudo isso que uns apontam como avanços dignos de nota e louvor. mas não. na prática a coisa funciona de uma outra forma. profissionais trocam o diálogo com os familiares por "jaules" e um abraço amigo por doses cavalares de Aldol. em Belo Horizonte, a clínica Casa Freud, que tinha a proposta mais honesta e digna sobre a qual já ouvi falar e pude ler sobre não foi à frente. conversando com o seu idealizador, ouvi que faltava apoio. bem, e é essa mesma sociedade, que nega apoio a projetos responsáveis, que vira o rosto para o diferente, que quer sentar para discutir a questão. não, melhor não. é melhor deixar a fala apenas para pessoas que, como Gullar, sentem ou sentiram o que é partilhar a ilusão das coisas com os seus entes queridos.


Foto: reprodução Epoca - Gullar posa
no apartamento em que mora sozinho,
em Copacabana. O filho Paulo vive há
cinco anos num sítio em Pernambuco.


Sorôco, sua mãe, sua filha
(Guimarães Rosa )

Aquele carro parara na linha de resguardo, desde a véspera, tinha vindo com o expresso do Rio, e estava lá, no desvio de dentro, na esplanada da estação. Não era um vagão comum de passageiros, de primeira, só que mais vistoso, todo novo. A gente reparando, notava as diferenças. Assim repartido em dois, num dos cômodos as janelas sendo de grades, feito as de cadeia, para os presos. A gente sabia que, com pouco, ele ia rodar de volta, atrelado ao expresso daí de baixo, fazendo parte da composição. Ia servir para levar duas mulheres, para longe, para sempre. O trem do sertão passava às 12h45m.

As muitas pessoas já estavam de ajuntamento, em beira do carro, para esperar. As pessoas não queriam poder ficar se entristecendo, conversavam, cada um porfiando no falar com sensatez, como sabendo mais do que os outros a prática do acontecer das coisas. Sempre chegava mais povo – o movimento. Aquilo quase no fim da esplanada, do lado do curral de embarque de bois, antes da guarita do guarda-chaves, perto dos empilhados de lenha. Sorôco ia trazer as duas, conforme. A mãe de Sorôco era de idade, com para mais de uns setenta. A filha, ele só tinha aquela. Sorôco era viúvo. Afora essas, não se conhecia dele o parente nenhum. (continua).